A Sociedade Vegetariana Brasileira rebateu uma matéria que a Veja publicou na última quinta-feira (28) afirmando que o consumo de carne seria benéfico para o meio ambiente. Segundo a reportagem, a criação de animais para esse fim permitiriam maior biodiversidade no ambiente.
Em um tom quase irônico, a SVB respondeu citando conceitos básicos de ecologia, fundamentais para a compreensão do funcionamento de um ecossistema. A organização explicou os conceitos de cadeia alimentar e nível trófico para, enfim, chegar à conclusão de que a área necessária para a alimentação de organismos que ingerem carnes é muito maior do que a utilizada para outros organismos. Isso se deve aos processos de transferência de energia entre os níveis tróficos da cadeia alimentar: quanto mais distante da base (que são os vegetais), mais indivíduos precisam ser ingeridos.
“Não é preciso fazer muitos cálculos para entender que quando áreas maiores são necessárias para a produção de alimento, haverá mais desmatamento, mais destruição de habitats, e mais perda de espécies. Atualmente, a produção de carnes usa 83% das terras cultiváveis do planeta para pastagens e produção de ração, mas fornece apenas 18% das calorias consumidas globalmente”, escreveu a SBV.
Veja a íntegra:
Em sua matéria “Carne animal é importante para a proteção do planeta, dizem cientistas”, a Revista Veja reproduziu uma notícia publicada no The Telegraph esta semana. Na matéria, afirma que “tirar a carne da alimentação diária não é tão ecológico quanto muita gente pensa. Isso porque os animais criados para a alimentação ajudam a aumentar a biodiversidade”.
Resolvemos repassar assim, de forma bem didática, alguns conceitos básicos, apresentados a alunos do ensino fundamental brasileiro, sobre cadeias alimentares, para que qualquer pessoa possa tirar suas próprias conclusões sobre as afirmações da reportagem. O conteúdo está disponível no próprio Ministério da Educação. Vamos lá:
1. Uma cadeia alimentar é uma sequência de transferência de energia e matéria, na qual um organismo serve de alimento para o outro. A posição que cada organismo ocupa nesta cadeia é chamada de ‘nível trófico’.
2. Os organismos produtores – plantas e algas – são o primeiro nível trófico. São capazes de produzir seu próprio alimento através da fotossíntese, aproveitando a energia solar. Os consumidores primários (segundo nível trófico) se alimentam dos produtores, ou seja, são as espécies herbívoras. Os consumidores secundários (carnívoros), por sua vez, se alimentam dos herbívoros, e assim por diante ao longo da cadeia.
3. Em cada passagem de um nível trófico a outro, há diminuição da energia disponível. Por exemplo, quando um herbívoro se alimenta de uma planta, a maior parte da energia que ele consome é, naturalmente, usada para mantê-lo vivo (a energia é transformada em calorias). A energia que permanece disponível (sob a forma de carne – ou ‘biomassa’) para um carnívoro que irá se alimentar do herbívoro será apenas uma fração muito pequena da energia que o herbívoro consumiu.
4. Como todos os organismos precisam de energia para sobreviver, e como há mais energia disponível nos níveis tróficos iniciais, um número maior de organismos poderá sobreviver em uma área sendo consumidores primários (herbívoros) do que consumidores secundários ou terciários. Ou seja, a área necessária para alimentar organismos que consomem carne é muito maior do que a área necessária para alimentar organismos que consomem vegetais. Este princípio é ilustrado nas conhecidas ‘pirâmides ecológicas’. Na base da pirâmide, temos um grande número de produtores, seguido por números sucessivamente menores de consumidores primários, secundários, terciários, e assim por diante.Quanto mais próximo da base da pirâmide, mais eficiente é o consumo do ponto de vista energético. Há menos perda de energia.
Não é preciso fazer muitos cálculos para entender que quando áreas maiores são necessárias para a produção de alimento, haverá mais desmatamento, mais destruição de habitats, e mais perda de espécies. Atualmente, a produção de carnes usa 83% das terras cultiváveis do planeta para pastagens e produção de ração, mas fornece apenas 18% das calorias consumidas globalmente [1]. Convidamos a Revista Veja a tirar suas conclusões.
1: Poore, J. & Nemecek, T. Science 360, 987–992 (2018)